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Mirada Poética

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outras miradas | blog poético

medo II

29/01/2015 · por Natália Menhem · 3 comentários em medo II

de ir sem se despedir.
de deixar dor.
de deixar sofrimento.

se viu do tamanho que era:
mínimo para querer minimizar o sofrimento alheio,
incapaz de impossibilitar o desfecho da vida,
que inevitavelmente se encerra.

um passo atrás, trocou as lentes.
compreendeu pouco,
mas sentiu que era uma dor inevitável demais
pra ser sofrida antecipadamente.

o amor deveria bastar.
poderia construir uma nova ordem das coisas
e se fazer entender a dor,
no tempo em que ela ocorresse.

potência. criação.
sem o minimalismo diante do impossível,
se via do tamanho que podia
pra transformar o possível.

medo.
amor.
potência.
criação.

poetas do sub-verso

29/01/2015 · por Natália Menhem · Nenhum comentário em poetas do sub-verso

como ser,
se não se nascer?
e nascer, mas não se saber?
saber e não o viver
é como ser,
sem ter sido.
vir, sem ter vindo,
mexer sem ser um bom mexido
uma bomba que nunca explodiu
o barco que nunca zarpou
a cachaça que não se bebeu
a toalha que nunca se usou
o gozo contido
o ser sempre com vergonha
com melindre
– sem mexer nem ser mexido.

(e de que adianta assim?)

medo I

medo I

29/01/2015 · por Natália Menhem · 2 comentários em medo I

por vezes, tinha medo de dormir.
lhe disseram que se chamava terror noturno,
mas ninguém nunca lhe explicou o que seria aquele terror.
gostava da noite.
gostava do dia.
passava horas observando o céu, a entender tudo com os sentimentos.
quando o medo de dormir chegava, tentava respirar fundo.
a respiração ficava curta, a cabeça confusa,
lágrimas saltavam dos olhos sem o menor controle.
tinha ideias mirabolantes. e um cansaço latente.
depois de algumas noites mal dormidas,
sabia que pre-ci-sa-va dormir e isso aumentava qualquer terror.
tentava contar as ideias, contar o cansaço,
contar o medo. como se enumerar os medos os diminuísse.
seu medo era não mais ver o céu.
medo de não mais acordar.
e por isso passava pela noite até que o sol se fizesse presente.
tinha vencido mais um dia. mais uma noite de medo.
tinha medo de não sentir mais nada,
e dessa dor ser ainda maior nos que ficavam.
até que seu pai construiu o telhado de vidro que ela tanto queria.
primeiro em seu quarto, depois na sala.
observavam o céu juntos, antes de dormir.
falavam trivialidades.
vendo o céu, se esqueceu do medo de não vê-lo mais.
e toda vez que começava a lhe faltar o ar antes de dormir,
contava as estrelas.
até não saber o que era sonho e o que era realidade.

somos todos passageiros

somos todos passageiros

29/01/2015 · por Natália Menhem · 1 comentário em somos todos passageiros

é domingo. um domingo quente, quer dizer, agora está quente. as nuvens que amanheceram o dia deram espaço ao céu azul e ao sol de meio dia. a rua abriga uma obra gigantesca, que ocupa sete andares abaixo da rua: desse parto nascerá um futuro shopping center. seu processo de construção faz do presente um algo sempre movimentado e barulhento, incluindo nas madrugadas, quando caminhões dão rés sem fim, toneladas de concreto são derramadas e pedras são despejadas reproduzindo a trilha sonora de um terremoto. ou de um pesadelo. mas é domingo e felizmente a rua hoje está calma. carros passam, pessoas passeiam, nenhum barulho irritante se faz ouvir.

e então, alguns gritos. da sala de um apartamento lá do alto não dá mesmo pra entender. ouvem-se, mas não se entendem bem as palavras. uma coisa entende-se, no entanto: não são gritos amigáveis ou brincalhões. ouve-se o pânico, apesar de não se ouvirem as palavras. e então buzinas. muitas buzinas. gritos entrecortados. da janela, vê-se: primeiro um moço grita muito com um motorista de taxi. ele parou o taxi na pista da esquerda, no recuo da obra, e desceu do carro. os dois estão na quina do carro, perto da rua, o moço que gritava antes agora grita grita grita muito com o taxista. ouve-se apenas a sua voz de homem fora de si, voz gritada, arranhada, nervosa. o passante gritando com o taxista: “vai se meter, é? de onde tirou isso de agora se meter?”. lá do alto não se ouvem respostas do taxista, mas se ouvem as respostas do carro, que continuam a buzinar buzinar buzinar. enquanto isso, uma mulher corre. ela olha pra trás entre um sprint e outro, pára e olha por cima do ombro para o moço que está a gritar com o taxista e que mantém um olho nela e outro no intrometido. ela já está na ponta do quarteirão e cada parada para olhar para trás parece demorar mais do que deveria. graças ao espirito turrão do moço, nervoso por demais com o taxista que parou pra se meter na briga dos dois, ela já dobrou a esquina e seus cabelos, depois de saltitarem ao fundo dos tapumes da obra, já são invisíveis.

a moça continua sua fuga. o moço retoma a corrida atrás da moça. muito bravo, larga o taxista pra trás. os carros retomam suas rotas. o taxista entra em seu carro e retoma sua jornada. os gritos passaram por aquele espaço-tempo. as pessoas passaram. os carros passaram.

a rua observa, aridamente, seus passageiros. gritos, ruídos, pessoas, máquinas. são todos passageiros daquele espaço-tempo.

não se sabe porque ele corre atrás dela, não se sabe porque ela grita nem porque ela foge. não se sabe se ela tem pra onde fugir ou se foge só do seu medo imediato. não se sabe nem aonde chegaram depois de tanta corrida. não se sabe se os motoristas buzinadores o fazem para assustar o moço que grita ou para apoiar a moça que foge e o homem que dirige um táxi e se solidariza com os passantes. de todos, ele é o mais acostumado ao fato de que somos todos passageiros.

sub-verso dos subvertidos enrustidos.

28/01/2015 · por Natália Menhem · Nenhum comentário em sub-verso dos subvertidos enrustidos.

são aqueles que sabem
que devem entender o que sentem
e antes mesmo de saber o gosto do sentido
amassam-no e jogam-no fora.

‘eu devo mesmo ser muita doido’,
olham praquilo tudo e pensam.
sem saber que na hora que falam
afastam uma boa doidice do parto (ou três ou centenas decorrentes)
– relegando-a aos doidos profissionais,
assumidos,
declarados
e não assumindo-a como atributo também pertencente

(….ssssshhhhh…)

aos enrustidos
sub
ver
sivos.

mirada poética

28/01/2015 · por Natália Menhem · Nenhum comentário em mirada poética

tem gente que olha pras nuvens e vê um elefante.
um elefante roxo.
outros vêem, no céu, apenas escorpião, sagitário,
três marias e cruzeiro do sul.
alguns têm cofres,
outros um hipopótamo chamado filomeno.
a vida pode ser sonho,
feito diria calderón de la barca.
a vida pode ser dura.
pode ser nada.
pode não ter sentido nenhum.
e pode ser sentida poeticamente.
muito sentida.

há muita poesia no ar.
há muita poesia pra ser vista
– catada no chão
– no fundo de um tanque cheio de roupas coloridas de molho
(roupas desbotadas)
– embaixo do sapato que se calça todas as manhãs.

há muita poesia pra ser sentida.
ser fungada
espirada
inspirada
espirrada.

pra voar no ar,
(como pólen)
só que invisível e
sem causar alergia.

o mundo sentido com mais poesia
pode ser miragem
pura ilusão

ilusão necessária
pura necessidade
precisão pura
de mais imprecisões.

compartilho aqui
miragens minhas
– quando acontece d’eu ter a sorte
de respirar uma lufada de ar poético
(que é sempre um ar fresco)
pra modo de entender melhor
essa grande miragem
em que mundamos.

fique à vontade. nuvem agua

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